O que significaria conjugar alteridade e universos paralelos, dois conceitos distintos, como sendo duas formas de descrição de um mesmo evento?
A alteridade, tanto no significado linguístico comum, como filosófico ou psicológico, descreve o indivíduo como um ser único, diferente dos demais, que são diferentes entre si. Logo, o universo que eu enxergo, decifro e publico é diferente do universo que você enxerga, decifra e publica. Você talvez esteja pensando que isto seja uma afirmação muito forte e até bizarra, uma vez o mundo físico é o mesmo para todos e nós nele conseguimos dialogar. Mas vamos devagar. Comecemos a definir um pouco o que é nosso cérebro. Ele é um receptor/emissor de sinais que funciona de forma analógica. Isto quer dizer que entre um ponto de máximo e outro de mínimo, existem infinitos pontos intermediários habilitados a se manifestar o que não ocorre na forma digital, onde só temos dois estados: o de máximo (passa corrente) e o de mínimo (onde não passa a corrente). São em torno de cem bilhões de neurônios interconectados que literalmente dançam enquanto a ressonância passeia pelos seus labirintos, entremeados de filtros, roteadores, classificadores, loops de feedback, tudo orquestrado por uma infinidade de moléculas neuroreceptoras, neurotransmissoras, mediadores, supressores, inibidores e facilitadores. E cada cérebro é construído de uma maneira ligeiramente diferente, pois o meu DNA é ligeiramente diferente do teu. O nosso cérebro funciona como uma antena e quando ela é apenas ligeiramente diferente, percebemos universos ligeiramente diferentes, ou muito diferentes à medida que a diferença entre as antenas aumenta.
O exercício da cultura faz com que um agrupamento produza universos apenas ligeiramente diferentes um do outro, o que confere coesão e permite que eles se conectem externamente entre si de uma maneira satisfatória.
És um luar / Ao mesmo tempo luz e mistério / Como encontrar / A chave desse teu riso sério – assim cantam Beto Guedes e Caetano Veloso em Luz e Mistério. Como eles, tantos outros abordam o tema e descrevem como harmônicos incríveis foram capazes de serem construídos para depois serem desfeitos.
Ao longo da história do ser humano, nos mostra como uma solução foi buscada na tentativa de melhor administrar essa multiplicidade de universos que se mostram algumas vezes belos e outras vezes sinistros.
Todos estes universos possíveis e imagináveis existentes em um dado momento se interceptam em um único ponto no espaço-tempo: o presente. Se geometrizarmos estes universos como membranas tridimensionais que se interceptam neste ponto, percebemos que elas se movem, pois o presente não é estático, e se movem em uma única direção, pois nós nascemos, vivemos e morremos e não o contrário. Esta seta do movimento é dada pela entropia do universo como um todo, que só aumenta. Porém a vida que se desenvolve neste universo, vai na direção contrária, diminuindo sua entropia. Se tomarmos todos os universos gerados pelos seres humanos como passíveis de serem aceitos, podemos dizer que temos uma entropia máxima, pois todas as opções possuem a mesma chance de se validar. É o que nos diz a alteridade.
Toda essa multiplicidade de universos decorre da incapacidade que temos de nos conectarmos internamente, ou seja, ligarmos os nossos cérebros entre si.
Essa realidade tem um novo capítulo, pelo avanço no estudo da conexão entre cérebros desenvolvida por Miguel Nicolelis e colaboradores, que conseguiram fazer com que macacos pensassem em conjunto na solução de problemas para obtenção de comida. Quais as implicações dessa nova realidade são um completo mistério. Todas as possíveis estimativas que fizermos das possíveis direções que esta nova realidade pode ter sempre serão vagas e inexatas, pois o principal atributo do novo decorre de uma mudança de fase representada pelo modelo do caos probabilístico, cujos efeitos somente aparecem após a mudança de fase. Quem poderia imaginar que a internet, um estado de compartilhamento universal de ideias faria com que os seres humanos ao contrário, se aglutinassem em tribos que compartilham universos semelhantes acentuando o extremismo.